quarta-feira, 7 de novembro de 2012

PORTO - JANGADA


 Aos poucos o espírito foi-se

                            afinando, -
Com o roer dos dias na moenda.
Perdi o fio antigo – A ilusão primeira –
Daí perdi todas as ilusões; resta
                            a derradeira –
-         O Silêncio –
Porque tive de ser tudo menos o previsto?
Estar em todas as partes e ausente de mim?
Deploro o destino que escreveu-me n’alma,
Ou foi min’alma que não seguiu o destino?
- Talvez não exista destino e nem alma;
para que toda a culpa e sofrer pertença
                            ao corpo
Ao corpo e a consciência.
Fui tudo o que eles quiseram que eu fosse,
Menos o que sempre quis ter sido;
Vendi água de poço
Fui padeiro
Carreguei leite engradado
Ajudante de pedreiro
Vendi balas e doces,
Belas falsas
                   belas falsas,
Na estrada do nordeste
Quando passam os caminhões
Apinhados
                            empoeirado
De nordestinos ao Rio.
Há…
Já fui tantas coisas para os outros
Que talvez tenha esquecido o que
                            realmente queria
Basta de ser Porto.
Quero ser Jangada
E sair por aí ao sabor
Dos ventos e das ondas
Bater em praias desertas
Em ilhas nunca encontradas,
Soçobrar em mar bravio
Apodrecer nos recifes
Ou reclusos em crateras
Por ninguém inda exploradas.
Basta ser Porto,
                            quero ser Jangada
Eu que nunca acreditei muito
                            em min mesmo
Mas sempre religiando os sonhos
                            que não me pertenciam.
Eu que nunca atirei pedras
                            aos santos
Pagando, entretando, por estes pecados,
Desculpando o vulgar que havia
                            nos outros
Reprovando o incomun que diabólicamente
                            em mim nascia.
Aos diabos…
         aos diabos a consciência,
Que nunca provou de Deus,
Aos inferno…
         aos infernos Deus,
Que nunca provou da consciência.
Aos poucos o espírito foi-se afinando
De monarquia à república,
Da prisão total à uma liberdade
                            Incomensurável,
Sufocando têmporas e olhos
E nariz e garganta
De expectador à artista
                            nesta falsa peça do viver.
De relhador à cavalo
                            à liberdade
                                               à república.
Mas basta!…
Basta de ser Porto.
Quero ser Jangada ao Mar… ao Mar… ao Mar…
                    

Nenhum comentário:

Postar um comentário