quarta-feira, 10 de abril de 2013


R E T O R N O




Volto ao Rio grande do Norte, como o filho que retorna,
                                                                           A casa materna.
Do exílio forçado foram-se os anéis, ficaram os dedos e as mãos
                                                                           Calosas.
Há cinqüenta anos atrás, seguia a pé com minha mãe, buscar
Alimento na casa dos Saraivas e dos Cabrais. Que se casaram com
                                                                           Os Botelhos.
Das Rocas, ao Grande Ponto, do Baldo ao alecrim, nada é como
                                                                           Antigamente.
Apenas a Igreja São Pedro está incólume com sua torre
 apontando o céu.
Meu Deus! A ribeira já não é a mesma. Se parece hoje comigo.
Vielas escuras, portas fechadas, ruas desertas.
Sem risos, falatórios, festas e flores, Sem Ferreira Itajubá fazendo
                                                        Versos e empinando papagaio.
Nem Zé areias aprontando as suas.
A Ribeira já não é a mesma com forrós e frevos e a dança-de-coco.
Foi exilada dentro de sua própria terra, parte de um corpo
                                                        Amputado.
Descriminada como eu, por falar macaxeira e ter a cabeça-chata.
Esquecida por não ter acompanhado o chamado progresso.
Ribeira dos mercadores, dos carnavais, de todos os poetas.
Vamos observar, serenamente, o painel de Dorian se desbotando
                                                        Na praça das Mães.
Sem sofrer, ou pensar que poderíamos ser diferentes, sem pensar
                                                        Na glória.
Deixa-me ficar contigo, até o silêncio chegar, e alguém contar
                                                        A tua  completa história.
                   



VIDA
  
Tenho estrelas nas mãos, raios, luares
Verde mar de tormentas, calmarias,
Noite belas de risos e folias,
Os saborosos frutos dos pomares

E tenho filigrana em meus teares
E uma mesa plena de iguarias,
Tenho em meus ouvidos sinfonias,
Gravadas, uma a uma em seus alares

Se hoje e sol, e escura a rua
Se meus pés calcam feios, frios, cardos
Se não houver a noite a linda lua

Tenho nas mãos estrelas, sol nascente
Tenho alfazema, luzes, tenho nardos
Que muito perfumaram, antigamente.



VERSO E INVERSO

A França faz a bomba de hidrogênio
E o câncer mata os homens seculares.
                            E afinal,
                            Por que evoluímos?
Por que a consciência busca o gênio,
E o homem vence planos estelares?

A fome mata...Biafrenses,
E a bonança os dias de Onassis.
                            E afinal?
                            Por que nós progredimos?
Se o êxodo fatal dos cearenses, daria termo um pequeno Oasis?

A chantagem prende os diplomatas,
E os grilhões os ideais sensatos.
                            E afinal?
                            Por que nos libertamos?
Por que nos rotulamos democratas,
E aplicamos rótulos abstratos?

O Sangue plástico cura a leucemia,
E o sangue puro é derramado em guerra.
                            E afinal
                            Por que nós nos amamos?
Se abrigamos no peito a hipocrisia.
E o ódio tem a amplidão da terra.
                            14/01/71



UMA ROSA NA CALÇADA




Há uma rosa nascendo entre pedras,
                                               Cimento e cal
Latente, debaixo de edifício, e praças,
                                               Muros  e gente.
Que desconhece o valor do seu perfume,
                                               Do tálamo e da cor…
Houve tempo em que os pássaros, os poetas, os namorados,
                                               Sonhava com esta rosa.
Bastava-lhe o simples rorejar do amor
                                               Para o cimo da perfeição.
Rosa clandestina de um mural sombrio
Diáfana em seu pobre florescer.


Há uma rosa nascendo no centro da cidade
No ritmo cadenciado dos motores dos carros
Nos corações eivados de paixões
Ângulo maior que São Gonçalo augura
Rosa campestre, sibilina, asfaltada
Quem me dera renascer!
                                               E criança brincar
                                               Com mãos verdas
                                               E dizer
                                               Poesia na calçada
Retirando uma pedra, retirando duas pedras
                                               E as rosas libertá-las
Rosa de Cal,
                   De pedra,
                                Do povo!
Afrontando os edifícios-gente que a esmaga
Agarrada ao pendão-maior agigantada em luzes
Sufocada na metrópole que hoje é São Gonçalo


26/08/75




Um  homem subiu ao palanque fez discurso e intitulou-se
                                                                                     Comunista.
Falou da fome, do baixo salário, da liberdade e do seu ódio ao
                                                                                     Capitalismo.
Mas, o que tem a ver a fome com o seu rótulo vestido?
A fome é da esquerda ou da direita ou, infelizmente, se chama
                                                                                     Fome?
E se alastra sobre os povos qual peste epidêmica, ignorando
                                                                                     O nome.
O país, a bandeira, o hino, a crença, ela será sempre o algoz
Um rio que seca, por não cuidarmos de sua nascente à foz.
Esta questão pertence ao Homem, não do ista ou do ismo,
Que afasta o problema com o seu ódio e com o sofismo.



T R I L O G I A

Pés descalços
Pernas acinzentadas
Olhar espantado
A negra vê
O filho brincar
Com carrinho de mão


Pôr sobre a cabeça
Infinito azulado
O satélite americano
Brinca de espião.


God save américa forever
Com todas suas bandeiras
Para sempre américa



Faz tempo que o sol
Aqui não nascia;
Nem gosto do verde
Sentir não podia


Nem poucos sorrisos
Amantes olhares
Nem lábios roçando
A leves sonhares


Faz tempo que o verso
Aqui não havia
Nem planos que nova
Manhã irradia.


Nem mesmo lembranças
Soprando o telheiro
Despertando a alma,
Ninar derradeiro


Nem mãos aos afagos
Aqui não havia
Faz tempo que a vida
Aqui não vivia.




As rosas não mudam
Do homem o destino
Nem banho de rio
Ou luar de prata
Nem flores silvestres
Ou nuvens de nata
Não mudam do homem
Seu pouco destino


O que deves fazer
C'oa saliva amarga
No canto da boca
A dor no teu peito,
Silencio de espanto
Transbordando a alma?


As rosas não mudam
Do homem o destino
Nem banho de rio
Ou flores silvestres
E grande a floresta,
Medita, menino.




SOSSEGA CORAÇÃO


Sossega coração, sossega, embora
Sei de quantos tormentos atravessas
Dos caminhos tortuosos que engressas
Sossega coração, já, sem demora

Sossega coração, do amor agora
Não se pode fazer quaisquer promessas
Perdeu-se o tempo de sonhar c'oa aurora
Atravessa esta ponte, e atravessa

Descansa desta longa caminhada
Refaz-te desta imensa cicatriz
Depõe ao chão a tua pobre cruz

Relembra a antiga e límpida alvorada
Descansa, procurando ser feliz
Sossega coração, e busca a luz




SONETO Nº 5


Eu reconheço o amor pelo olfato
Pelo sabor de sua ambrosia
Pelo gosto de alecrim, pelo tato,
A embriagues de sua fantasia.

Eu reconheço o amor pela alegria
Do prazer ao mínimo contato
Por todo o aconchego, pelo ornato
A luz que o aquece e o alumia

Tão novo quanto a própria alvorada
Tão denso quanto a própria atmosfera
Tão leve quanto o pássaro errante

Tu és este amor em debandada
Este fluxo e refluxo, incessante
Desde que chegastes, primavera 



SEDE


Sede
De azul
De espaço
De sonhos
Realizáveis...

Sede
De luz
De calor
De reformas
Palpáveis...

Sede
De fé
De razão
De atitude
De compreensão...

Sede
De cor
De festa
De beleza...

Sede
Dolorosa...
...sede
De outro
Coração...





O BELO ADORMECIDO 

Era uma vez... e tanto tempo faz...
Um príncipe feliz em seu reinado,
Entre pardais e flores, perfumado,
Vivia nos seus sonhos colossais.

Era uma vez… palácio de cristais
E templos e corcéis, lindo brocado,
Tinir de taças, alto cortinado,
Colunatas em grandes catedrais.

Era tarde de luz, cristalizada,
E vestida em cantatas e florais
A camponesa se dizia a amada.

E o príncipe, em repouso numa alfombra,
Teve a roçar-lhe os lábios sua sombra
E ao mundo seu não despertou, jamais.





No meio da terra

Existe algum fosso


Em meio ao deserto
Existe algum poço


No meio da noite
Uma réstia de luz


Em meio ao calvário
Existe uma cruz


Em meio a descrença
Existe algum crente


No meio da rua
Algum pingo de gente.


12/02/81



ESTRELA RADIANTE

No céu uma estrela
Mais nova irradia.

E quem puder vê la
Jamais na agonia

Irá esquecê-la
Será sua guia

Tão pura e tão bela
Derrama alegria

Por sobre a mazela
Tem luz que alumia

A tua janela
Tão grande vigia.

Estranha viela
De grande valia

Estrela, aquela,
Desperta, vigia
Em tua janela

No céu uma estrela
Mais nova irradia.